O movimento LGBTQIA+

Parada LGBT

Os primeiros registros históricos da homossexualidade datam de cerca de 1200 a.C., por isso a maioria dos estudiosos afirmam que a orientação homossexual foi aceita em várias civilizações. No entanto, em vários momentos e ao redor do mundo, a comunidade LGBT+ foi e continua sendo estuprada, torturada, morta e seus direitos usurpados.

A homossexualidade em outras civilizações

A homossexualidade ou o relacionamento homoerótico era aceito em diversas civilizações. Na Grécia Antiga a relação homoerótica entre erastes (homens mais velhos) e eromenos (homens mais novos, de 12 a 18 anos) era vista como parte importante da educação masculina, essa prática tinha uma finalidade muito mais pedagógica do que sexual; a sociedade grega dessa época era bissexual, mas dentro de certos limites. A prostituição era aceita, mas seus participantes eram proibidos de ocupar cargos públicos; relacionamentos entre homens mais velhos e, mais novos, eram aceitos, porém não entre homens de mesma idade; também não era aceito o homem afeminado.

Em Esparta, os casais de amantes homens eram incentivados como parte do treinamento militar. Em Tebas (colônia espartana) existia o Pelotão Sagrado de Tebas, tropa de elite composta apenas por casais homossexuais. Eles acreditavam que essa prática traria mais coesão às tropas. O Pelotão Sagrado de Tebas, por exemplo, eram quase imbatíveis, quando em batalha, lutavam com muita bravura para que nada acontecesse a seus parceiros.

Os melanésios acreditavam que o coito homossexual era a única forma de transmitir o conhecimento sagrado. O imperador Hammurabi, na antiga Mesopotâmia, cerca de 1750 a.C., elaborou um conjunto de leis que dava alguns privilégios aos prostitutos e às prostitutas que participavam dos cultos religiosos. Há mais de três mil anos, as leis hititas chegaram a reconhecer a união de pessoas do mesmo sexo. Nas mitologias como a grega, romana, hindu e babilônica existe a homossexualidade e o sexo não é tratado somente para fins reprodutivos.

Logo, em outras civilizações e em outros tempos (principalmente antes do advento do cristianismo) percebe-se como a homossexualidade é tratada e vista de formas diferentes e não é criminalizada, demonizada, castigada ou proibida.

A criminalização da homossexualidade

Isso começa a mudar, no início do século IV, quando Constantino (imperador romano) converteu-se a fé cristã e o cristianismo tornou-se obrigatório no maior império do mundo (o império romano). O sexo passou a ser encarado somente para fins reprodutivos e a homossexualidade passa a ser vista como algo anormal. No século VII, com o nascimento e expansão do islamismo, junto com a influência cristã, reforçaram a ideia de sexo para procriação. Os primeiros registros nesse sentido remontam ao Império Genghis Khan, no século 13, lá a sodomia resultou na pena de morte.

Porém, até meados do século XIV, embora a fé condenasse os prazeres da carne, as práticas e os costumes não mudaram muito. A igreja passa a enfrentar diversas crises, principalmente com a reforma protestante de Martinho Lutero; e com o humanismo renascentista, os valores clássicos são retomados e assim, a forma antiga de relação masculina volta à tona.

Entretanto, entre os anos de 1347 e 1351 a Peste negra ou Peste Bubônica assolou a Europa matando milhões de pessoas, como a ciência ainda não sabia as causas e nem a cura da doença, o “pecado” dos seres humanos passou a ser apontado como causa de tamanha desgraça; judeus, hereges e sodomitas passaram a serem culpabilizados e julgados como causa dos males da sociedade.

Em Florença, por exemplo, no ano de 1432 a sodomia foi proibida e homossexuais foram cassados pelos Ufficiali di Notte (agentes da noite) e entre os anos de 1432 e 1502 mais de 17 mil pessoas foram incriminadas e três mil, condenadas por sodomia.

No início do século XIX, na Inglaterra, 80 homens foram mortos acusados de sodomia, somente em 1861 o país aboliu a pena de morte e dez anos de trabalhos forçados tornaram-se a consequência para quem praticasse os atos de sodomia.

A homossexualidade vista como doença

Os séculos seguintes também não mostraram grandes avanços, com genocídio em massa de pessoas LGBT+. No final do século XIX e grande parte do século XX, em contradição com a época de grandes avanços técnico-científicos, a homossexualidade era abordada como doença mental ou defeito genético e práticas torturantes que afetavam o físico e o psicológico, passaram a serem empregadas para “tratar” de pessoas LGBT+.

A preocupação científica com a homossexualidade começou no século XIX, mais tarde, junto das ideias emergentes sobre pureza racial e eugenia dos anos 1930, a opinião científica, médica e psiquiátrica da época acreditava que a homossexualidade era doença resultante de anormalidade genética associada a problemas mentais na família, que a homossexualidade era congênita e hereditária.

Durante o avanço do nazismo na Alemanha, a população LGBT+ foi levada para os campos de concentração e extermínio. De fato, ambos os símbolos do movimento derivam desse momento histórico: na Alemanha nazista, o triângulo rosa invertido era usado para identificar homens homossexuais ou pessoas trans designadas homens; o triângulo preto invertido identificava prisioneiros como associais ou impróprios para a vida comunitária.

Em 1949, o neurocirurgião português António Egas Moniz recebeu o Nobel de Medicina pelo seu trabalho no desenvolvimento de uma intervenção cirúrgica ao cérebro chamada de lobotomia, que consiste em cortar nervos do córtex pré-frontal. A lobotomia passou a ser usada em “tratamentos” para os homossexuais, na Suécia três mil gays foram lobotomizados, na Dinamarca 3500 gays, nos Estados Unidos portadores de “disfunções sexuais” lobotomizados chegaram às dezenas de milhares.

O renomado matemático e cientista da computação, Alan Turing, considerado, junto com Charles Babbage, um dos pais da ciência da computação, foi castrado quimicamente como punição pelo governo britânico em 1952, mesmo depois de trazer melhorias cruciais que ajudaram a acabar com a Segunda Guerra Mundial. Até a década de 1960, a homossexualidade era infração em todos os estados dos Estados Unidos, exceto Illinois, onde até então era um símbolo do progressismo no mundo ocidental.

Veja também:

  1. A Operação Tarântula
  2. Representatividade LGBTQIA+

O movimento LGBTQIA+ como símbolo de de luta, resistência e orgulho

Os anos 1960 foram marcados por movimentos sociais e humanitários que questionavam os valores tradicionais da sociedade e que trouxeram diversas discussões, entre elas, sobre gênero e sexualidade. A população LGBT+ discriminada e reprimida reuniam-se em guetos e formavam comunidades para se apoiarem e se defenderem. Desde há muito tempo esta comunidade é atacada, violentada, estuprada, espancada, assassinada e seus direitos usurpados. Em 1987, no Brasil, ocorreu a Operação Tarântula, com o objetivo de caçar e prender travestis e transexuais que se prostituíam na capital paulista. Essa operação violentou cerca de 300 travestis e durou pouco menos de duas semanas, mas, apesar do fim da operação, o fim da violência contra as pessoas LGBT+ nunca cessou.

No dia 28 de junho de 1969, Stonewall Inn, um espaço que recebia o público LGBT+, foi o local onde essas pessoas reuniram-se e resistiram contra a violência policial. Este acontecimento histórico de resistência dessas pessoas contra a repressão e contra a violência, ajudou a desencadear o movimento pelos direitos civis LGBT+.

Os anos seguintes foram marcados de muita discriminação, violência, assassinatos, mas também de muita resistência, luta e direitos conquistados. Durante as décadas de 1980 e 1990 a maioria dos países desenvolvidos descriminalizou a homossexualidade e proibiu a discriminação contra gays e lésbicas. Somente em 1990 a OMS (Organização Mundial da Saúde) removeu a homossexualidade (antes referida de forma errada e preconceituosa como “homossexualismo”, já que o sufixo “ismo” significa doença) da lista de doenças.

Em 1992 houve a fundação da Associação de Travestis e Liberados (ASTRAL), neste ano também Katya Tapety se tornou a primeira travesti a conquistar um cargo político sendo eleita vereadora do estado do Piauí. A primeira parada do Orgulho Gay no Brasil ocorreu em São Paulo, em 1997, reunindo em torno de duas mil pessoas. Hoje, a Parada Livre de São Paulo é a maior do mundo, tendo reunido no ano de 2012, segundo dados da organização, cerca de quatro milhões de pessoas. (NETTO, FRANÇA, FACCHINI, 2006). Em 1999, apesar da homossexualidade não ser mais considerada doença pela OMS, muitas pessoas tentavam impor a sexualidade heteronormativa, gerando “tratamentos” como “curas gays” que, neste ano, foi proibida pelo Conselho Federal de Psicologia. Em 2002 a redesignação do sexo masculino para o feminino foi permitida pelo Conselho Federal de Medicina, em 2010 a redesignação do sexo feminino para o masculino também foi permitida. Em 2011 foi legalizada a união estável entre pessoas do mesmo sexo, com isso os casais homoafetivos foram reconhecidos como entidade familiar e puderam realizar a adoção conjunta e, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça aprovou uma resolução que obriga os cartórios a realizar o casamento civil entre os homossexuais. O uso do nome social foi permitido em 2016, mas pessoas trans ainda eram obrigadas a andar com documentos não compatíveis com a sua identidade. Em 2018, o STF autorizou a mudança do nome de registro de transexuais e transgêneros, mesmo daqueles que não passaram por cirurgia. Em 2019, houve a criminalização da homofobia que apesar de não garantir punição para quem é homofóbico, ela ajuda a combater discursos preconceituosos; e depois de todo o estigma da aids ser uma “peste gay”, em 2020, o STF derrubou a restrição que proibia homossexuais de doarem sangue.

Foram muitos direitos conquistados, mas ainda há muito pelo que lutar, o Brasil é o país que mais mata trans e travestis em todo o mundo, 90% da população transexual e travesti do País tem a prostituição como fonte de renda e possibilidade de subsistência e ainda há muito preconceito, discriminação e violência contra as pessoas LGBT+. São milhões de brasileiros que vivem inseguros de serem eles mesmo, que sofrem violência psicológica e física e que lutam por direitos básicos de existência como o direito à vida, direito ao acolhimento familiar, direito à moradia, combate à violência doméstica, acolhimento de pessoas em situação de rua e em dependência química, direito à educação básica e superior públicas, defesa e melhoria do SUS, prevenção às IST’s, tratamento da dependência química, direito ao trabalho digno e formal, acesso aos direitos trabalhistas, direito ao transporte público seguro, segurança pública, direito de ir e vir, violência contra LGBTs.

O movimento LGBT+ é a luta em prol dos gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e travestis, queers, intersexos, assexuais, pansexuais e todas as formas de expressão de gênero e orientação sexual; é a luta para defender todos os direitos já conquistados e conquistar todos os direitos em prol da vida e da defesa da vida das pessoas LGBT+, é a luta em prol da possibilidade de um amanhã onde exista a real liberdade para ser quem se é. O movimento LGBT+ é ORGULHO E RESISTÊNCIA.


Bibliografia

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MATIAS, Murilo. O que foi a Rebelião de Stonewall Inn, que deu origem ao Dia do Orgulho Gay. UOL, 2021. Disponível em: https://educacao.uol.com.br/noticias/2021/06/28/o-que-foi-a-rebeliao-de-stonewall-inn-que-deu-origem-ao-dia-do-orgulho-gay.htm#:~:text=O%20que%20foi%20a%20Rebeli%C3%A3o%20de%20Stonewall%20Inn%2C%20que%20deu,ao%20Dia%20do%20Orgulho%20Gay&text=At%C3%A9%201966%2C%20em%20Nova%20York,eram%20criminalizadas%20na%20mesma%20%C3%A9poca. Acesso em: 08/10/2022.

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